Brasil cobra pouco imposto sobre herança. Fato ou Fake?

Brasil cobra pouco imposto sobre herança. Fato ou Fake?

Por Dênerson Rosa

Quando os Estados Unidos decidiram ajudar os Aliados contra os Nazistas, a CIA sigilosamente contratou o psicanalista Walter C. Langer para traçar o perfil psicológico de Hitler. Afinal, uma guerra raramente se vence apenas pela força, e sim pela combinação da força com a capacidade em conhecer o adversário e se antecipar aos seus movimentos.

Quando este estudo se tornou público (1972), foi possível conhecer a precisão da análise de Langer que, entre outros, concluiu ser provável o suicídio de Hitler caso fracassasse em sua guerra.

Dentre outros pontos, Langer mencionou que Hitler defendia que “as pessoas acreditarão em uma grande mentira mais cedo do que em uma pequena; e se você repeti-la com frequência, as pessoas mais cedo ou mais tarde acreditarão.”

Este conceito já se encontrava no livro Mein Kamf (Minha Luta), publicado em 1925, no qual Hitler defendia que as pessoas caem muito mais facilmente vítimas da grande mentira do que da pequena mentira.

Portanto, quando o Ministro de Propaganda da Alemanha Nazista (Joseph Goebbel) falou que “Uma mentira contada mil vezes se torna uma grande verdade”, não estava fazendo nada mais do que uma citação de seu chefe.

A muitos anos, pessoas do governo vem repetindo (a boa parte da imprensa ecoando) que o Brasil é um dos países que menos tributa herança no mundo, e para isso citam relatórios e estudos diversos que fazem um “comparativo” com o que seria a tributação sobre herança em outros países: Japão: 55%; Coreia do Sul e Suíça: 50%; França: 45%; Inglaterra e EUA: 40%; Bélgica e Alemanha: 30%; etc.

Estas afirmações são verdades? Ou apenas mentiras que milhares de vezes vêm sendo repetidas?

Às vezes tem-se a impressão de que o mundo inteiro (exceto o Brasi) cobra imensos tributos sobre heranças. Mas isso está distante da verdade. Canadá, Suécia, China, Índia, Austrália, Áustria, Noruega e Israel são alguns dos países que não tem tributação sobre herança ou herdeiros. Até mesmo nossos Irmãos (Portugal) e Hermanos (Argentina e Uruguai) recebem heranças sem ter que pagar nenhum tipo de tributo.

Mas a maioria dos países que cobram elevados impostos sobre herança o fazem apenas quando os herdeiros são parentes distantes, ou seja, quando o autor da herança não tinha cônjuge ou filhos.

E nos raros países que aplicam tributação mais elevada a herdeiros diretos (cônjuge ou descendentes), isto normalmente é acompanhado de elevadas faixas de isenção, nas quais não existe nenhuma tributação. Inglaterra e Alemanha tem faixa de isenção de tributos de heranças de 500 mil dólares (+-R$2,5 milhões). A Itália somente tributa valores superiores a 1 milhões de euros (+-R$5,4 milhões), enquanto os EUA aplicam uma faixa de isenção de tributos de herança de 13 milhões de dólares (+-R$65 milhões).

Mas todas estas informações são apenas dados isolados, que dão espaço a muitas interpretações e conclusões, mas que não permitem uma efetiva análise.

Todavia, existe um dado bastante relevante que é habitualmente ignorado nas “análises” que concluem ser baixa a tributação sobre herança no Brasil: O tamanho da arrecadação do imposto de herança em relação ao PIB do respectivo país.

No Brasil, a tributação sobre herança representa hoje 0,15% do PIB. Estamos bastante distantes dos recordistas Bélgica (0,70%), França (0,55%) e Japão (0,40%). Mas não estamos tão distantes de países como Inglaterra (0,25%), Espanha (0,24%), Alemanha (0,22%) e Suíça (0,17%). E estamos à frente de países como Itália (0,04%), Irlanda (0,14%) e até mesmo dos Estados Unidos (0,14%).

No caso dos Estados Unidos, há um ponto relevante a ser considerado. Quando o autor da herança não for cidadão nem residente americano, mas tiver bens ou ativos naquele país, a faixa de isenção fica reduzida para 60 mil dólares. Se forem considerados apenas os impostos sobre herança cobrados de cidadãos americanos, a tributação representa apenas 0,09% do PIB, pois 34% do imposto de herança americano são pagos por estrangeiros ou não residentes.

No Brasil, não temos dados exatos, mas sabemos que a cobrança de tributos sobre herança de não residentes é inexpressiva. O que permite concluir que o Brasil tributa herança de seus cidadãos (0,15% do PIB) em nível superior em 60% ao que os EUA tributam os cidadãos daquele país (0,09% do PIB).

Quando analisados números, percebe-se ser bastante falaciosa a afirmação de que o Brasil cobra pouco imposto sobre herança. Parece bem mais discurso de quem tem síndrome de Robin Hood, querendo fazer graça invadindo bolsos alheios.

Vivemos hoje em dia uma situação única na trajetória da humanidade. Nunca foi tão fácil ter acesso à informação e ao conhecimento. Mas, às vezes, isso parece não ter grande utilidade para a maioria das pessoas, que continuam facilmente acreditando em grandes mentiras.